Pensando a Fenomenologia Existencial
O universo da Psicologia se descortina em inúmeros caminhos a serem trilhados. Cada caminho marcado por uma teoria, um jeito de pensar, conceitos bem estabelecidos. Diante de tantas bifurcações, que critérios o profissional pode estabelecer para fazer a escolha por um desses caminhos? Um alerta neste momento: antes de escolher um deles e seguir uma teoria específica, precisamos lembrar que, enquanto psicólogos, algumas coisas não dependem de uma teoria, como, por exemplo: a postura de respeito do profissional pelo paciente, pelo contexto da sessão de terapia, pelo sigilo profissional; e a clareza e o bom senso de saber que a terapia, seja qual for, não pode tudo – nenhuma teoria tem todas as respostas!
Na abordagem Fenomenológica Existencial, um dos possíveis caminhos dentro da Psicologia, encontramos conceitos e idéias que norteiam nosso trabalho. É importante que, ao optar por uma abordagem, o profissional aprofunde seus conhecimentos nesse pensamento, para que a certeza no escolha seja sempre renovada.
Muitos colegas questionam a necessidade de optar por uma abordagem específica: “mas por que eu tenho que seguir uma teoria?”. E eu diria o seguinte: “acredito muito mais na ideia de que é a teoria que nos segue!”. Vou explicar:
Trilhar um dos caminhos oferecidos pela Psicologia deve fazer sentido a cada profissional que se propõe essa tarefa. E para fazer sentido, não podemos nos encaixar em conceitos e explicações prontas, simplesmente. Precisamos encontrar aquelas que mais dizem respeito ao nosso modo de ser, a maneira como concebemos o homem, o mundo, as relações. Portanto, escolhemos uma abordagem que mais de perto dialoga com o nosso modo de ser. Antes de entrarmos em contato com o que significa ser-no-mundo, já temos uma compreensão prévia de que o homem não está separado desse caldeirão chamado realidade. O homem faz parte dele e vice-versa. Um não existe sem o outro.
Feitas essas observações, vamos nos aproximar do Existencialismo e da Fenomenologia, propriamente ditos.
Podemos pensar em Existencialismo como uma corrente filosófica que nos oferece fundamentos para compreendermos o homem: sua estrutura básica, suas angústias, a forma de ser e como se relaciona consigo, com o mundo e com os outros. Fenomenologia, por sua vez, é o caminho, o método, que utilizamos para conduzir as sessões, para guiar o nosso encontro com o paciente.
Entendemos o Exsitencialismo, a partir dos conceitos de grandes filósofos, como Kierkegaard, Nietzsche, Heidegger, Sartre, entre outros. A proposta existencialista é a de orientar-se ao homem para revelar seu fundamento, analisando as questões que estão em pauta, pois elas são a estrutura do relacionamento homem-mundo. Existir é ser afetado pelo que vem ao seu encontro, por isso, para o existencialismo, o homem só existe enquanto “ser abertura” e “ser-com”, ou seja, ser que se relaciona e é afetado pelo mundo, pelos outros homens, seres e coisas. Portanto, o olhar para o ser humano é sempre focado em suas relações e no modo que é afetado por elas.
O homem se mostra em sua existência cotidiana, em seu dia-a-dia, na forma como se relaciona e lida com as coisas do mundo. Os pequenos gestos e pequenos dizeres não escondem a essência do homem, pelo contrário, revelam-na. O psicólogo existencial não procurará, portanto, algo por trás do que se diz, mas entenderá o próprio dizer, as pequenas manifestações como sendo, em si mesmas, reveladoras do sujeito.
A proposta do psicólogo existencial, então, será analisar a forma como seu paciente se relaciona com o mundo, a forma como estabelece vínculos, incluindo a forma como se relaciona com o próprio terapeuta. Esses modos de se relacionar são sua forma de ser, sua identidade.
O método fenomenológico, descrito por Husserl, consiste na descrição do fenômeno (que é a experiência sobre o outro, ou sobre uma fantasia, ou um gesto, ou uma lembrança etc) como ele aparece. Para apreender esse fenômeno tal como ele se apresenta, temos que suspender os nossos conhecimentos, ou seja, pôr entre parênteses nossos pré-conceitos e pré-juízos. Só em um segundo momento, depois que apreendemos o fenômeno, ficando bem próximos a ele, podemos buscar teorias que sustentem aquilo que compreendemos do fenômeno.
No momento do encontro com o paciente, portanto, não há julgamento, não existem valores, uma vez que a teoria entrará num segundo momento. Existe sim, um terapeuta presente e disposto a encontrar alguém. E é esse alguém, o paciente, quem apresentará o que há de importante, quem mostrará o caminho, quem evidenciará o que é preciso ser trabalhado. Ao analista cabe seguir esse caminho apresentado, iluminando-o e revelando-o.
Nós, psicólogos existenciais, nos esforçamos para encontrar o outro onde ele está, e para entender o que ele entende e a forma como entende a fim de que se reconheça, assumindo a responsabilidade por suas escolhas e por daquilo que continua a escolher ser, em cada momento de sua vida. Nossa escuta deve ser dirigida àquilo que o outro fala, mostra, apresenta, de forma paciente e acolhedora.