A criança e o brincar

 

 

O brincar é uma das atividades que podem ser mais prazerosas na relação pais e filhos. É o momento em que a fantasia e a criatividade tomam conta da situação e as ações estão a serviço de um encontro mais autêntico. E para que isso aconteça não é preciso muito esforço – basta deixar a criança conduzir, ser o personagem que ela quer que você seja e embarcar nessa viagem de sonhos e aventuras. Não requer brinquedos sofisticados ou grandes histórias já prontas. Apenas disponibilidade para estar ali, junto a ela, naquilo que é mais próprio de seu mundo – na brincadeira.

É através do brincar que a criança entra no universo simbólico e da linguagem e assim estabelece sua própria maneira de relacionar-se com o mundo. Daí o cuidado que os pais precisam ter para não podarem esse processo. Oferecer brinquedos muito “prontos”, que não deixam espaço para a imaginação, pois praticamente eles – os brinquedos – brincam sozinhos, é quase um crime à infância! Bom mesmo é que a criança encontre os seus brinquedos no espaço que ocupa, com aquilo que tem à mão – e nesse contexto, uma colher pode se transformar em um avião, a tampa da panela é um excelente tambor, e assim ela vai criando seus próprios brinquedos, suas histórias, divertindo-se e enriquecendo o seu mundo. E se nesse trajeto ela tiver a presença afetiva dos pais ou responsáveis, suas descobertas e conquistas serão muito mais emocionantes!

Então, de acordo com esse raciocínio, percebemos que brincar não é só um momento divertido na vida de uma criança. Essa atividade está relacionada com seu desenvolvimento de forma indiscutível. Diria, até, que é vital para que haja uma vida saudável em todos os sentidos. E não é só o brincar com o videogame, computador ou assistir programas de televisão – atividades tão rotineiras hoje em dia, infelizmente... É o brincar com a imaginação, deixar que elas tomem os objetos da casa e os transformem em fadas, monstros e espadas, castelos encantados, enfim, desde que não ofereça risco à criança, será essa fantasia atuada que permitirá que os pequenos representem a realidade e aprendam a lidar com ela.

Misturando a imaginação a coisas concretas do dia-a-dia, a criança constrói a sua capacidade de simbolização. Juntando objetos, símbolos, pessoas, situações, fantasias e sentimentos ela compõe uma imagem de si própria e de seu ligar no mundo. Por isso, brincar não é só brincar... É divertido sim, mas também é um trabalho e tanto!

É importante que os pais participem desses momentos, mas que isso não seja um peso, uma obrigação. É claro que a criança percebe quando o adulto está ali “sem querer estar”. E isso não promove todos os benefícios que o brincar proporciona. Estar com a criança é estar aberto ao que acontece naturalmente quando se cria um ambiente favorável, acolhedor, criativo. Quando se quer estar! É se jogar no chão, andar descalço, sujar a mão, fazer bagunça, fazer coisas estranhas, dançar, dar risada, cantar sem saber a letra da música e inventar na hora uma muito melhor que a original. Casa arrumadinha e brincadeira de criança definitivamente são coisas que não combinam!

Alguns pais podem indagar nesse momento sobre os limites. Pois bem, eles também são fundamentais para o crescimento saudável da criança, mas precisam ser apresentados no momento certo e de forma coerente. Hora da brincadeira é a hora de explorar, de experimentar, de tirar as coisas do armário, da gaveta, de guarda-las em lugares errados, espalhar brinquedos pelo chão. É lógico que o limite nesse momento terá que ser colocado para que se preserve a integridade da criança, dos pais e da casa em si – por exemplo: ela não poderá brincar com as facas que estão na gaveta da cozinha, nem sair colocando fogo na casa. Também faz parte limitar o espaço da brincadeira: o quarto, aquela parte da sala, o quintal, a varanda... e nesse espaço destinado ao brincar, a criança poderá exercer seu direito de ser criança. Só não vele deixar um espaço apertadinho, minúsculo, só por medo de bagunçar a casa... o negócio é fazer o seguinte combinado com a criança, independente de sua idade: “você vai brincar, fazer bagunça, mas depois de acabar a brincadeira vamos guardar as coisas em seus lugares!”. Isso costuma funcionar muito bem!

Assim como a criança precisa de espaço para brincar, ela também precisa de tempo.  Hoje em dia nos deparamos cada vez mais com crianças e suas agendas lotadas de compromissos: aula de inglês, balé, reforço escolar, futebol... Precisamos estar atentos a um ponto: quanto mais tempo a criança tiver para brincar, mais oportunidades terão de amadurecer de forma saudável.  Compromissos com aulas de língua, esportes ou artes acabam estressando a criança muito cedo e impedindo justamente o desenvolvimento de sua criatividade.

E para terminar essa nossa pequena reflexão, gostaria de dar algumas dicas de brinquedos e brincadeiras mais adequadas ao processo criativo e à formação da criança como ser humano:

Crianças pequenas adoram brinquedos de encaixe, brinquedos de montar, brinquedos que produzam estímulos sonoros e visuais. Gostam de brincar de esconder, de brincadeiras que envolvam movimento. Papel e lápis de cor também são ótimos recursos para a criança desenvolver sua criatividade.

Massinha de modelar ou argila, além de serem extremamente relaxantes, ajudam a criança em seu desenvolvimento psicomotor. Para as maiores: contar histórias – tanto lendo em um livro infantil, como contando uma história que se tenha na memória ou até mesmo criando histórias com as crianças.

As que já estão na fase escolar podem adorar fazer teatrinho, imaginarem-se como personagens de contos de fadas ou simplesmente representarem cenas de sua vida cotidiana, experimentando diversos papéis.

Brincar com sucata, criando os próprios brinquedos, também é uma ótima forma de promover um espaço criativo e tão importante ao desenvolvimento infantil.  

E por fim, é importante dizer que a convivência com outras crianças também é fundamental nesse período. A troca e o contato com seus pares são fatos decisivos no desenvolvimento das relações sociais e todas as habilidades que esse cenário comporta. Em um mundo cada vez mais virtual e de espaços reduzidos – seja pela questão da violência ou simplesmente pelo estilo de vida da maior parte das famílias de hoje – os encontros reais tornam-se preciosidades que devem ser preservadas o máximo possível.

A criança faz a parte dela naturalmente, mas para isso é preciso o adulto / responsável que dê condições e crie o espaço favorável para que ela possa ser quem ela é: criança!